Título: Discriminating among theories of spiral structure using Gaia DR2
Autores: J. A. Sellwood, Wilma H. Trick, R. G. Carlberg, Johanna Coronado, e Hans-Walter Rix
Instituição do primeiro autor: Steward Observatory, University of Arizona, Tucson AZ, EUA
Status: Submetido ao MNRAS, acesso livre no arXiv
Galáxias espirais são assim nomeadas devido a sua característica mais proeminente – seus braços espirais. Esses filamentos enrolados de estrelas e poeira são a principal razão pela qual fotos de galáxias espirais, tiradas originalmente para meios de pesquisa, costumam também estar nos planos de fundo de computadores e em capas de livros decorativos. Nossa intuição liga corretamente as estruturas em espiral com o movimento de rotação dessas galáxias, apesar do mecanismo exato responsável pela formação dos braços espirais ainda não ser bem compreendido. O objetivo do artigo de hoje é explorar essa questão comparando mapas gerados pelo segunda publicação de dados do telescópio espacial Gaia com simulações.

Muitas teorias foram propostas para explicar como os braços espirais se formam. Talvez a mais intuitiva delas — referida como modelo de braço material — diz que braços espirais representam sobredensidades na galáxia que acabaram enroladas ao redor do núcleo galáctico devido a rotação da galáxia (veja a figura 2). Uma teoria alternativa diz que braços espirais são estruturas transientes que resultam da superposição de ondas de densidade instáveis e levam as estrelas a se acumularem ou se espalharem intermitentemente.
Infelizmente, estudar braços espirais de verdade para testar teorias é uma tarefa complicada. Astrônomos tradicionalmente se baseiam em comparações de simulações de galáxias com observações de galáxias espirais reais. Mas mesmo isso fornece apenas uma ideia incompleta, devido a dificuldade de analisar as órbitas de estrelas individuais nos braços espirais, mesmo na nossa própria galáxia.

Tudo isso mudou quando a missão Gaia começou a fazer suas observações. O telescópio espacial da Agência Espacial Européia trouxe uma revolução na astrofísica galáctica, fornecendo dados de posição e velocidade precisos para aproximadamente um bilhão de estrelas na vizinhança solar. Esse fluxo incrível de dados permitiu que astrônomos realizassem estudos sem precedentes ao investigar as características da nossa galáxia (veja aqui, aqui, aqui e aqui, por exemplo). O artigo de hoje usa o potencial desses dados para avaliar as várias teorias de formação de braços espirais.
Os autores selecionam uma subamostra de estrelas dos dados do Gaia que estão localizadas no disco fino da Via Láctea e que por isso esperam ser melhores traçadoras da estrutura espiral. Para garantir alta precisão, eles descartam estrelas mais distantes que 200 parsecs do Sol, e depois disso eles ainda ficam com uma amostra impressionante de 300.000 estrelas, a maioria com distâncias medidas com incertezas menores que 1%. Eles então constroem vários mapas dessas estrelas, com diversas projeções de suas coordenadas (veja a figura 3). Para produzir alguns desses mapas, os autores usam as velocidades e posições das estrelas para calcular suas ações — quantidades como momento angular, que se mantêm constantes ao longo do tempo e podem ser usadas para definir o caminho completo da órbita de uma estrela individual (como mostrado no painel à direita na figura 3). Espaço de ação se revela ser particularmente útil para revelar as subestruturas que podem ser responsáveis pela configuração espiral da galáxia.

Tendo mapeado os dados reais do Gaia, os autores tentaram reproduzir esses mapas usando cada uma das teorias propostas para formação de braços espirais. Em cada caso, eles começam com uma distribuição de estrelas simulada suave e introduzem uma perturbação predita por uma das teorias que eles querem testar. Eles então produzem mapas similares de suas simulações e comparam com os dados reais.
O painel à esquerda na figura 4 mostra a projeção do espaço de ação para o modelo de modo transiente (no qual braços espirais são instabilidades de pequena duração). O painel à direita nessa figura mostra a mesma projeção para os dados reais do Gaia (o mesmo que o painel à direita na figura 3), dessa vez colorindo cinco características similares às preditas pela simulação. Mais similaridades entre essa simulação e os dados do Gaia aparecem em outras projeções também, sugerindo que o modelo de modo transiente pode ser a explicação correta para os braços espirais da Via Láctea. As simulações para a teoria de braço material não reproduzem os dados tão bem quanto o modelo de modo transiente, mas os autores não foram capazes de descartá-lo inteiramente. Eles também produzem simulações similares para um terceiro modelo, conhecido como modelo de aglomeração de massa, e neste caso eles foram capaz de descartá-lo devido às inconsistências entre simulações e dados reais.

Então onde isso nos deixa? Os autores são favoráveis ao modelo de braço transiente, argumentando que os dados parecem sugerir que os braços espirais da nossa galáxia são características de curta duração que aparecem e desaparecem intermitentemente. Apesar da análise não ser completamente conclusiva, e não descartar todas as teorias alternativas, ainda serve de demonstração dos benefícios dos mapas em espaço de ação. Também serve de outro lembrete da quantidade extraordinária de nova ciência disponibilizada pela segunda liberação de dados do Gaia, que continua a inspirar pesquisa de ponta quase depois de meio ano depois de sua publicação. Fique ligado!
Adaptado do post em inglês: How the Milky Way Got its Spiral Arms, por Tomer Yavetz.
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