Ameaça à vida no sistema Trappist-1: a atmosfera dos planetas pode estar sendo destruída

Título: The threatening magnetic and plasma environment of the Trappist-1 planets

Autores: Cecilia Garraffo, Jeremy J. Drake, Ofer Cohen, Julian D. Alvarado-Gomez, e Sofia P. Moschou

Instituição do primeiro autor: Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics, EUA

Status: publicado no Astrophysical Journal Letters [acesso aberto]

A recente descoberta de sete planetas do tamanho da Terra no sistema TRAPPIST-1, onde três deles se localizam dentro na zona habitável, fez com que esse sistema se tornasse um dos favoritos na busca pela vida.

Trappist-1 é uma estrela bastante diferente do nosso Sol. Ela é bem menor e menos luminosa, sendo classificada como uma estrela anã vermelha (tipo espectral M8V). Por causa disso, neste sistema a zona habitável (ZH),  em que os planetas podem receber luminosidade suficiente para ter água em estado líquido, é bem mais próxima da estrela-mãe. Mas não apenas os planetas da ZH estão próximos à estrela, todos outros outros estão também em órbitas bem próximas, o que faz com que o todo o sistema Trappist-1 caiba dentro da órbita de Mercúrio!

Porém, existe um probleminha com essa proximidade toda. A estrela Trappist-1 possui uma alta atividade magnética e é responsável por gerar ventos estelares muito fortes (emissão contínua de partículas carregadas). Isso faz com que seus planetas fiquem vulneráveis a um alto nível de radiação (de raios-X à UV) e à ação do vento estelar, que podem causar a erosão de suas atmosferas ou a evaporação de oceanos. Lembrando que a atmosfera tem um papel fundamental para a manutenção da vida, pois ela absorve radiação altamente nociva como UV e raios-X.

No artigo de hoje, os autores realizaram simulações dos ventos provindos da estrela Trappist-1 para analisar seu impacto nos planetas orbitando esta estrela, principalmente aqueles que estão dentro da zona habitável.

Como foi realizada a simulação?

Neste artigo os autores utilizaram um programa de simulações magnetohidrodinâmicas (estudo da evolução do campo magnético a partir do movimento de fluidos condutores, abreviada como MHD) para modelar os ventos da Trappist-1 e seus efeitos nos planetas orbitando esta estrela. O programa utilizado foi projetado inicialmente para simular o vento solar, porém ele pode ser muito bem adaptado para outras estrelas também. O modelo usa os parâmetros físicos da estrela e um magnetograma (representação espacial da variação do campo magnético) como condição de entrada. Entretanto, como ainda não se foi obtido um magnetograma da TRAPPIST-1, os autores utilizaram o magnetograma de uma estrela que possui parâmetros similares, a GJ 3622. A partir da estrutura-3D obtida para o vento, foi possível extrair informações da sua velocidade e da pressão que ele exerce sobre as órbitas de todos os planetas deste sistema.

Figura1
Figura 1: Simulação 3D da magnetosfera do planeta e dos ventos estelares para TRAPPIST-1 para um campo magnético médio de 600G (cerca de 600 vezes mais forte que o do Sol), considerando o plano orbital (topo) e um corte meridional (x = 0, abaixo). O diagrama de cores representa a intensidade da velocidade do vento (esquerda) e a densidade (direita) normalizada pelo valor do vento solar a 1UA. As órbitas dos 7 planetas estão também apresentadas em cada figura.

 

Então, os ventos da estrela Trappist-1 realmente podem afetar a habitabilidade de seus planetas?

Os autores encontraram que a velocidade do vento da Trappist-1 é apenas um pouco maior que a dos ventos solares (ver Figura 1). Entretanto, a densidade do vento é 100.000 vezes mais alta do que a do vento solar a 1 UA (distância Terra-Sol) e sua pressão total (magnética e dinâmica) está entre 3 a 6 ordens de magnitude mais alta que os valores da pressão do vento solar a 1UA (ver Figuras 1 e 2). Esses fatores indicam que os ventos de Trappist-1 são muito mais fortes que o vento solar.

Logo, a resposta para a pergunta é ‘sim’. Esses ventos são fortes o suficiente para erodir toda a atmosfera dos planetas, criando um ambiente mais hostil para o desenvolvimento da vida.

Figura2
Figura 2: Pressão total do vento de Trappist-1 (normalizada pelo vento solar a 1UA) para todas as órbitas dos planetas de Trappist-1, considerando um campo magnético de 600G (esquerda) e 300 G (direita). A superfície de Alfvén, região onde a propagação do plasma do vento pode ir na direção da estrela (fora dela o vento se propaga para longe da estrela), é representada pela linha branca.

E se um destes planetas tivesse um campo magnético, ele seria capaz de protegê-lo contra a ação erosiva dos ventos da Trappist-1?

Para verificar se um campo magnético seria capaz de barrar o vento vindo de TRAPPIST-1, os autores analisaram Trappist-1f, um dos planetas que se encontram dentro da zona habitável do sistema. Como não existem medições do campo magnético deste planeta, os autores assumiram que Trappist-1f tem um campo magnético igual ao da Terra. Eles observaram que a pressão do vento da Trappist-1 é capaz de abrir as linhas do campo magnético do planeta nas regiões do pólo, fazendo com que partículas energéticas provindas do vento precipitem direto na atmosfera do planeta. Isso faz com que a atmosfera continue sendo erodida ou sofra evaporação. Portanto o campo magnético do planeta não é capaz de protegê-lo da ação do vento da TRAPPIST-1.

As condições dos ventos de Trappist-1 encontradas neste estudo podem resultar na perda total da atmosfera de seus planetas, dificultando a existência de vida neles. Portanto, futuros estudos sobre a habitabilidade destes planetas devem levar em conta a ação dos ventos.

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