Autores: Mattia Bulla, Michael W. Coughlin, Suhail Dhawan, Tim Dietrich
Instituição do primeiro autor: The Oskar Klein Centre, Department of Astronomy, Stockholm University, Suécia
Status: Disponível em formato pré-print no ArXiv
Introdução
A Constante de Hubble, , mede a taxa de expansão do Universo. No Universo local,
pode ser aproximada por uma famosa equação linear conhecida como a Lei de Hubble-Lemaître:
(1)
onde é a distância de luminosidade e
a velocidade do fluxo de Hubble. Medidas diretas da Constante de Hubble,
, são uma das maiores questões da Cosmologia atual. Conforme medidas se tornaram mais precisas, uma grande incerteza sobre essas medidas de
emergiu devido à discrepância entre valores de
obtidos através de observações do Universo local ou primordial. A radiação cósmica de fundo em micro-ondas nos dá uma estimativa do
do Universo primordial que está em tensão com medidas do Universo local, obtidas via Supernovas do tipo Ia. Eventos que produzem ondas gravitacionais (OGs) detectáveis pelo LIGO/Virgo foram propostos como sondas promissoras que podem nos fornecer medidas independentes de
. Por isso, estes eventos de OGs são comumente chamados de ”sirenes-padrão”, pois se valem do fato que a amplitude da OG,
, é dependente da distância de luminosidade
. Além disso, em sistemas binários que produzem OGs, é possível medir uma massa efetiva conhecida como massa de gorjeio (tradução livre de chirp mass),
, composta pela massa de dois objetos compactos. Tanto a amplitude da OG,
, quanto a sua taxa de mudança em função da frequência,
, dependem desta massa. Portanto, medidas de
e
fornecem uma medida absoluta de
.
A próxima peça do quebra-cabeça é o redshift (desvio para o vermelho), denominado z, que pode ser obtido da contraparte eletromagnética (EM) do sinal de OG, bem como da sua galáxia hospedeira, sendo assim chamadas de ”sirenes brilhantes”, ou de um ponto de vista de análise estatística de aglomeração de galáxias, ”sirenes escuras”. A Constante de Hubble é então obtida via Eq. (1) por medidas independentes de
e z. A vantagem deste procedimento é que o valor de
pode ser obtido sem a necessidade de uma escada de distâncias cósmicas – conforme explicado neste astropontos – ou mesmo de um modelo cosmológico específico. A maior incerteza nesta medida de
via OGs reside na dificuldade em restringir o ângulo de inclinação i do sistema binário. Estimativas de i podem ser aprimoradas por meio da dependência do sinal eletromagnético da OG com o ângulo de visada, θobs. Os autores do artigo de hoje revisam os vínculos atuais sobre
usando explosões de raios-gama (GRBs, do inglês gamma-ray bursts) e kilonovas (KN) observáveis do evento GW170817, comentando sobre a habilidade futura desta técnica em resolver a tensão de Hubble.
Vínculos sobre a inclinação de GRBs
Explosões de raios-gama lançam jatos relativísticos de um objeto compacto formado após uma colisão de buraco negro com estrela de nêutrons (BN-EN), ou de um sistema binário de estrelas de nêutrons (ENB).
A interação do jato com o ambiente ao seu redor produz uma espécie de “arrebol” consistindo na radiação síncrotron dos elétrons acelerados neste ambiente, que é visível tanto na faixa dos raios-X quanto na faixa do rádio. Para um certo valor do ângulo do jato, θj, o vínculo sobre é melhorado por um fator de dois em uma análise utilizando apenas OGs. Além do mais, um jato que se move próximo a velocidade da luz pode parecer estar se movendo com velocidade superluminal – acima da velocidade da luz – parecendo assim que ele está “perseguindo” a radiação emitida ao longo da linha de visada do observador. Portanto, uma medida da velocidade aparente pode restringir θobs − θj, assim melhorando os vínculos sobre
. O movimento superluminal do jato associado com GW170817, combinado com curvas de luz em rádio, levaram a uma melhoria da degenerescência entre θobs e θj.
Vínculos sobre a inclinação de Kilonovas
O evento de kilonova associado a colisões de ENB BN-EN consiste na emissão térmica provocada pelo grande fluxo de nêutrons neste processo de colisão através de um processo de rápida captura de nêutrons conhecido como processo-r. Como este fluxo consiste em diferentes componentes contendo uma variedade de composições e geometrias, a KN apresenta uma dependência do ângulo de visada. Este fato foi explorado no caso do GW170817 a fim de impor vínculos sobre o ângulo de inclinação, assim obtendo uma melhoria na medida do . Uma das primeiras análises deste tipo é resumida na curva rosa da Figura 1, mostrando que a incerteza sobre a medida de
foi reduzida em 34% comparado a dados contendo apenas OGs. Em contraste, um estudo mais recente, por meio do uso de espectroscopia, pôde reduzir esta incerteza ainda mais, obtendo uma melhoria de 54% sobre a incerteza da medida de
. Isto é mostrado na curva laranja da Figura 1.

Resumo e panorama
Eventos de ondas gravitacionais são sirenes-padrão promissoras para medidas de . A fim de atingir ~1% de precisão sobre este parâmetro, precisamos de 50 − 200 eventos com contraparte EM. O artigo de hoje mostrou que estes vínculos podem ser melhorados ainda em breve, utilizando menos eventos, se pudermos melhorar os vínculos sobre o ângulo de visada através do arrebol dos GRBs, movimento superluminal e KNs. Isso permite reduzir significativamente a degenerescência entre a distância e o ângulo de inclinação dos dados de OGs, assim melhorando a acurácia do valor inferido de
.
Ainda assim, a fim de obter acurácia suficiente nos valores inferidos de eventos de OGs com contraparte EM, é necessário que os erros sistemáticos desta abordagem de sirene padrão e da modelagem de GRB/KN estejam sob controle. Os erros sistemáticos que podem contribuir incluem erros de calibração, que podem after a medida da distância de luminosidade . Outras incertezas sistemáticas podem surgir dos modelos utilizados para ajustar os dados de GRB e KN, introduzindo assim um viés na medida de
.
Em conclusão, a próxima década nos fornecerá um aumento do número de detectores de OGs e de sua sensibilidade. Isto vai nos permitir uma maior compreensão sobre as incertezas sistemáticas e assim mostrar o potencial das sirenes padrões. O esforço combinado da comunidade astronômica multimensageira terá, portanto, um grande potencial em fornecer medidas precisas e acuradas da Constante de Hubble e, assim, uma possível solução para a tensão de Hubble.
Do astrobite original: Multi-messenger constraints on the Hubble constant, escrito originalmente por Alexandra Wernersson e editado por Jason Hinkle e Ali Crisp. Crédito da imagem de apresentação: National Science Foundation/LIGO/Sonoma State University/A. Simonnet