A Terra como um exoplaneta

Título: Which stars can see Earth as a transiting exoplanet?

Autores: Lisa Kaltenegger e Josh Pepper

Instituição do primeiro autor: Cornell University

Status: Publicado no MNRAS [acesso aberto]

Um exoplaneta é um planeta que orbita outra estrela que não seja nosso Sol. Nos quase 30 anos de ciência exoplanetária, já foram descobertas mais de 5000 planetas. Se você fosse um astrônomo vivendo em um desses exoplanetas, diria que a Terra é um exoplaneta! Isso leva a questão: a Terra foi descoberta por cientistas alienígenas? Enquanto essas questões entram nos limites da ficção científica, ainda podemos começar a quantificar as respostas baseando-se em ciência de verdade.

A técnica mais bem sucedida em encontrar exoplanetas é o método do trânsito, no qual a estrela é observada continuamente até que o brilho da estrela diminui à medida que o planeta em órbita passa entre nós e a estrela, bloqueando um pouco da luz por um intervalo curto de tempo. Esse método é bem poderoso em descobrir muitos exoplanetas porque podemos observar milhares de estrelas simultaneamente, comparado a outros métodos que devemos observar uma estrela de cada vez. Só com o método de trânsito, foram descobertos quase 4000 dos mais de 5000 exoplanetas conhecidos! Isso leva a pergunta, se somos tão bem sucedidos em usar o método do trânsito, poderia um cientista de um planeta alienígena fazer a mesma coisa? Se sim, eles poderiam ter visto a Terra transitando o Sol?

Enquanto não podemos ter certeza se há vida alienígena observando a Terra como exoplaneta, podemos estimar como muitos sistemas podem ter a oportunidade de nos encontrar. Porém, o método do trânsito tem seus problemas. Ele requer alinhamento perfeito entre a Terra, o exoplaneta e a estrela hospedeira. Um mínimo desalinhamento impede que observadores na Terra observem o trânsito (Figura 1). Além disso, a janela de trânsito se torna menor quanto mais distante for o exoplaneta de sua estrela hospedeira.

Exoplanetas com período orbital têm janelas de trânsito extremamente pequenas e são mais raros. Por exemplo, dos quase 4000 exoplanetas encontrados com o método do trânsito, apenas 203 deles (5%) têm períodos orbitais maiores que 88 dias (o período orbital de Mercúrio, o menor do Sistema Solar). É muito raro encontrar um planeta com período orbital longo como o da Terra, de 365 dias, não porque não existe, mas simplesmente porque a chance de encontrá-lo no alinhamento perfeito é muitíssimo baixa. Portanto, se astrônomos alienígenas quiserem ter a chance de encontrar a Terra, os seus sistemas planetários devem estar em perfeito alinhamento com o nosso.

Figura 1: O Plano da Eclíptica é um plano imaginário no céu onde os planetas orbitam (órbita em rosa). Da Terra, vemos o plano da eclíptica como uma linha no céu (linha tracejada de roxo). Algumas estrelas (de branco) podem coincidir de estar nessa linha e são aquelas que podem observar a Terra como exoplaneta. Durante diferentes instantes do nosso ano, indicado por duas Terras de azul na órbita, as estrela na eclíptica podem ver o trânsito da Terra. Figura do Astropontos, adaptada do Astrobite de Jack Lubin.

Então quais estrelas próximas têm esse alinhamento raro? O artigo de hoje encontrou essa resposta. Os autores usaram os catálogos do Gaia e do TESS, dois observatórios espaciais desenvolvidos para escanear o céu inteiro. Com esses dados, eles puderam identificar todas as estrelas que estão a 0,262 graus do Plano da Eclíptica, um plano imaginário com o qual todos os planetas do Sistema Solar estão posicionados com o Sol, veja a Figura 1. Se esse plano imaginário fosse estendido para o infinito em todas as direções, qualquer outra estrela neste plano (ou suficientemente próxima a ele) estariam alinhadas conosco, e então seriam as estrelas que poderiam ter os planetas alienígenas que poderiam observar a Terra transitando. Os autores buscaram apenas estrelas da sequência principal, excluindo estrelas em evolução e descartando estrelas sem parâmetros bem definidos.

O grupo identificou 1004 estrelas em 100 parsecs (326 anos-luz) da Terra com esse alinhamento. Os autores disponibilizaram uma tabela com os parâmetros sobre as estrelas, incluindo massa, raio, temperatura, e mais. O interessante é que duas dessas estrelas possuem exoplanetas conhecidos. Além disso, o grupo descobriu o espectro dessas estrelas: 77% das estrelas são M Dwarf, 12% são K Dwarf, 6% são G Dwarf como o Sol, 4% são F Dwarf e 1% são estrelas A Dwarf, veja a Figura 2. Esta amostra abrange toda a faixa de temperatura das estrelas, mas é fortemente ponderada em direção a estrelas menores e mais frias, consistente com a taxa de ocorrência geral de tipos estelares em toda a galáxia.

Esse trabalho é importante porque nos dá uma lista de grupos de pesquisa extra-terrestre, como o SETI e Breakthrough Listen. Essas iniciativas podem focar nessas 1004 estrelas como alvos de alta qualidade que podem já até saber da existência do nosso planeta, e então podem até mesmo estarem tentando contato conosco. Podemos usar essa lista para explorar ainda mais a busca por exoplanetas. Se nos concentrarmos nessas estrelas, podemos descobrir mais planetas nesses sistemas, abrindo portas para potenciais vizinhos que podem nos ver.

Por fim, os autores notaram que a lista pode ser um pouco desanimadora – ela se trata de uma única observação num instante específico do tempo. O que temos é a posição atual das estrelas, mas estrelas não são estacionárias, estão em constante movimento. Algumas estrelas fora da lista se movem para o alinhamento com o nosso sistema enquanto outras da lista podem sair do alinhamento em escalas temporais de centenas a milhares de anos. Como todos esses sistemas solares, incluindo o nosso, se movem pela galáxia, quem sabe se, ou quando, podemos encontrar algum vizinho.

Figura 2: Todas as 1004 estrelas alinha com a Terra num gráfico da Latitude Eclíptica vs Distância com a Terra, além do mapa de temperatura em cores, que mostra o tipo de estrela. A latitude eclíptica dá a direção no espaço. O gráfico mostra alto espalhamento no eixo y, que significa que as 1004 estrelas estão bem espalhadas em todas as direções. A maioria das estrelas está no limite de 100 parsecs. A maioria das estrelas são mais frias, do tipo M. Figura 2 do artigo.

Adaptado do Astrobite: “Earth as an exoplanet”, escrito por Jack Lubin.

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