Vamos desempoeirar a Constante de Hubble

Título: The Hubble Tension Bites the Dust: Sensitivity of the Hubble Constant Determination to Cepheid Color Calibration

Autores: Edvard Mörtsell, Ariel Goodbar, Joel Johansson, Schail Dhawan

Instituição do primeiro autor: Oskar Klem Centre, Department of Physics, Stockholm University, Suécia

Status: Submetido ao arXiv [24 May 2021], acesso aberto

Figura 1: Alguns métodos utilizados para calcular a Constante de Hubble e os seus resultados. São apresentados valores obtidos da radiação cósmica de fundo em micro-ondas (CMB), lentes gravitacionais, distâncias de SNIa calibradas com Cefeidas (SH0ES) ou com o topo do ramo das gigantes vermelhas (TRGB-SNIa), e a fonte de onda gravitacional GW170817. Figura 1 no artigo.


A Constante de Hubble (H0), que descreve a taxa de expansão atual do Universo, pode ser encontrada em todo lugar no campo da Cosmologia. Ela nos ajuda em tudo na área, desde determinar a idade do Universo a testar modelos cosmológicos. Uma superstar! Porém, a Constante de Hubble tem ganhado uma reputação de “encrenqueira” em tempos recentes por um motivo crucial: métodos independentes empregados para calculá-la tem produzido resultados altamente diferentes (Ver Figura 1). Uma das maiores discrepâncias vem do valor da Constante de Hubble medida através de Supernovas do tipo Ia (SNIa), que fornece um valor de H0 = 73.2 ± 1.3 (km/s)/Mpc, e da medida realizada com a radiação cósmica de fundo em micro-ondas (RCF), com valor de H0 = 67.4 ± 0.5 (km/s)/Mpc – uma diferença de 4.1 desvios-padrões! Uma discrepância tão grande tem deixado os astrônomos com a “pulga atrás da orelha”: estariam eles simplesmente medindo erroneamente o tamanho do Universo, ou seria este um indício de uma nova física fundamental esperando para ser descoberta? Uma vez que estes valores deveriam ser idênticos em teoria, esta diferença extrema entre eles tem deixado a comunidade astronômica atenta, iniciando uma corrida para resolver esta tensão de Hubble.

Investigando a Constante de Hubble da SNIa

Então, qual poderia ser o problema? Bem, primeiros vamos inspecionar o método usado para calcular a Constante de Hubble via SNIa. De acordo com a aparentemente simples Lei de Hubble-Lemaître, os dois ingredientes necessários para estimá-la são a velocidade que a supernova se afasta de nós, bem como a sua distância até nós. O primeiro ingrediente chave pode ser obtido através de seu desvio para vermelho (redshift em inglês), já que sabemos como o espectro das SNIa se parece. Para obter a distância das SNIa, astrônomos se baseiam em uma ferramenta conhecida como a escada de distância cósmica. Basicamente, astrônomos medem com precisão a distância até objetos próximos, dentro da Via Láctea, e então usam estas medidas para “subir os degraus da escada” por meio de objetos situados em galáxias mais distantes. Um passo desta escada vem de distâncias até estrelas variáveis do tipo Cefeida. Estas medidas de distâncias exigem cálculos precisos de suas respectivas magnitudes, que podem ser obtidas através da relação cor-luminosidade. Portanto, para medir distâncias de SNIa, astrônomos dependem indiretamente das distâncias até as cefeidas.

Contudo, esta relação cor-luminosidade pode ter um defeito fatal: ela assume que existe uma relação universal para todas as cefeidas. Mas e se esta for uma simplificação desastrosa? Bem, estas cefeidas situam-se em lares empoeirados, conhecidos como galáxias. Poeira galáctica pode absorver a luz emitida por estes objetos e então tornar suas cores mais vermelhas. Estudos anteriores demonstraram que, mesmo dentro da nossa Galáxia, o avermelhamento galáctico varia amplamente de uma região para outra. Se os astrônomos acidentalmente corrigem além da conta esta extinção por poeira, a escada de distância local é modificada, e portanto o valor inferido da Constante de Hubble também muda. Logo, os autores do artigo de hoje decidiram testar se a tensão de Hubble pode ser resolvida por modificações sutis nesta relação cor-luminosidade das cefeidas. Para este fim, eles se basearam em dados para derivar uma relação específica para cada galáxia individual.

Figura 2: Valores da Constante de Hubble encontrados usando relações cor-luminosidade ajustadas. Podemos ver que o valor obtido pela magnitude Wesenheit Rw (curva preta) se aproxima do valor encontrado pela RCF (curva marrom sombreada), diferentemente de trabalhos anteriores (curvas em verde). Figura 8 no artigo.

Vários métodos foram testados, mas um deles de interesse particular é baseado nas chamadas magnitudes de Wesenheit. Esta técnica foi usada para corrigir a cor da cefeida considerando tanto a extinção de poeira e variações em sua cor intrínseca. Após essas correções serem realizadas nas suas magnitudes, valores novos animadores foram encontrados para a Constante de Hubble. Os autores do artigo encontraram um valor que reduz a discrepância entre as medidas da Constante de Hubble em até 2 desvios padrões! Vocês podem conferir por si mesmos na Figura 2.

Então, isso significa que a tensão de Hubble foi resolvida? Ainda não. Como vimos, o valor da Constante de Hubble das SNIa depende diretamente de uma escada de distância cósmica bem calibrada. Contudo, medidas imprecisas de magnitudes de cefeidas podem ter deixado nossa escada de distâncias menos confiável do que astrônomos acreditavam originalmente. Por meio de um pouco de ajuste fino destas magnitudes levando em conta absorção de poeira e variações intrínsecas em cor, os autores puderem reduzir a discrepância entre as medidas da Constante de Hubble obtidas das SNIa e RCF. Apesar de mais pesquisa sobre o assunto ser necessária, explorar os erros potenciais em nossa escada de distâncias por parte das magnitudes das cefeidas é um novo caminho interessante para estudar, e assim finalmente resolver a tensão de Hubble. Quem sabe, provavelmente, a Constante de Hubble precise ser desempoeirada!


Adaptado da postagem original do astrobites “Let’s Dust off the Hubble Constant“, de Kayla Kornoelje

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