Título: A circumbinary protoplanetary disk in a polar configuration
Autores: Grant M. Kennedy, Luca Matrà, Stefano Facchini, Julien Milli, Olja Panić, Daniel Price, David J. Wilner, Mark C. Wyatt & Ben M. Yelverton
Instituição do primeiro autor:Departamento de Física e Centro de Exoplanetas e Habitabilidade, Universidade de Warwick, Coventry, Reino Unido
Status: Publicado na Nature Astronomy, acesso fechado
Estrelas binárias são objetos estelares muito bem conhecidos que são o resultado comum da formação de estrelas. No entanto, os exoplanetas ainda não são tão bem conhecidos assim e a maior parte do que sabemos sobre a sua formação vem de estudos de discos ao redor de estrelas isoladas. Na verdade, quase todas as “fotos bonitas” de discos protoplanetários que você já viu estão em torno de estrelas não-binárias/estrelas sem companheiras (com pelo menos uma exceção notável).
Nos casos mais simples, a rotação do disco das estrelas hospedeiras e as suas órbitas estariam todas alinhadas, uma vez que a rotação em pequenas escalas é herdada da rotação em massa da nuvem onde a estrela foi formada. No entanto, já observamos planetas que vão contra essa ideia, geralmente indicando que algo interessante está acontecendo. O astropontos de hoje apresenta as primeiras observações de um disco protoplanetário exatamente na configuração oposta: um disco em uma orientação polar em torno de um jovem sistema estelar binário.
Os discos são um efeito colateral comum da formação de estrelas (mesmo em torno das estrelas binárias) devido à conservação do momento angular. Esses discos de gás e poeira são os locais de nascimento das estrelas e dos planetas. As altas densidades permitem que a poeira se transforme em planetas e potencialmente iniciem a acumulação de gás. Enquanto a maior parte do tempo a rotação do disco tende a estar alinhada com a da estrela, é possível que os dois fiquem desalinhados. A dinâmica orbital nos diz que, se o disco agora desalinhado estiver em torno de uma estrela binária, ele irá precessar exatamente como um pião (ou seja, o vetor de seu momento angular girará). Um aspecto interessante da dinâmica é que essa precessão tem duas configurações estáveis. Se o desalinhamento é pequeno, a precessão é em torno do vetor de momento angular binário (apontando para fora do plano de sua órbita), mas para grandes desalinhamentos, a precessão se dá em torno da direção do pericentro do sistema binário (o vetor através do eixo maior da órbita binária). Este segundo cenário resultaria em um disco em uma órbita polar estável, que é exatamente o que foi observado em torno do HD 98800.
HD 98800 não é apenas um sistema binário, é um sistema quádruplo hierárquico. Em outras palavras, consiste em dois pares de estrelas binárias que se orbitam entre si. Cada sistema binário é rotulado com uma letra maiúscula (A ou B), enquanto cada estrela binária é rotulada com uma letra minúscula (a ou b). Os autores usaram o ALMA (Atacama Large Millimeter-submillimeter Array) para observar a emissão térmica da poeira do sistema (Figura 1) e a emissão da linha do gás monóxido de carbono (Figura 2) proveniente do disco. Conforme mostrado na Figura 1, o disco está ao redor do sistema B, enquanto o sistema A está em uma órbita de longo período. Os autores ajustam um modelo simples com as observações para determinar a orientação, tamanho e estrutura do disco.


Como só podemos ver a projeção bidimensional do disco no céu, é provável que exista alguma degeneração na orientação do disco. A Figura 2 mostra que o lado sul do disco está girando para longe da Terra, enquanto que o norte está girando em direção à Terra. No entanto, não sabemos se o lado leste ou oeste está mais perto ou mais longe de nós. O modelo de melhor ajuste indica que as duas inclinações possíveis do plano do disco estão ~ 26 ° fora do plano do céu (na direção ou longe da Terra). Estas duas orientações são 4 ° e 48 ° longe da configuração polar. Como o disco está em torno de um binário, a configuração quase polar é muito mais provável do que a orientação na metade do caminho entre polar e alinhado. Os autores fizeram simulações dinâmicas para demonstrar isso. O sistema binário (dentro de várias centenas de anos) se reorientou ficou um pouco deslinhado com a plano, em torno de 48 °, enquanto que a configuração anterior estava estável. A Figura 3 mostra um desenho animado da orientação mais provável do disco atualmente.

Então, como essa coisa se formou? Duas possibilidades são que o gás com momento angular ligeiramente diferente caiu no disco da nuvem primordial ou que houve alguma interação com outra estrela fora do sistema. É possível que uma estrela tenha permanecido após a interação e agora seja uma dos componentes do binário A deste sistema quádruplo. É até possível que essa interação tenha destruído um disco em torno de A. E por que esse sistema é tão interessante? A teoria nos diz que sistemas como esse deveriam existir e finalmente encontramos um! Agora a questão é: será que as estimativas corresponderão às nossas previsões. Além disso, esse disco é semelhante a discos em torno de estrelas sem companheiras, pois mostra sinais de crescimento de grãos. Este é o primeiro passo da formação planetária, convertendo a poeira de tamanho da ordem de microns em seixos do tamanho de milímetros e centímetros. Se planetas se formassem neste disco, eles definitivamente teriam um interessante ciclo de dia e noite!
Original em inglês: A protoplanetary disk on its side, por Samuel Factor.