Baseado no artigo: Exoplanets Biosignatures – a review of remotely detectable signs of life
Autores: E. Schwieterman, N. Y. Kiang, M. N. Parenteau e colaboradores
Insituição do primeiro autor: Universidade da California
Status: Publicado no Astrobiology
No astropontos desta semana nós vamos explorar um dos assuntos mais populares na área de exoplanetas: a busca por traços de vida, mais conhecida como bioassinaturas. As bioassinaturas são definidas como objetos, substâncias ou variações temporais que necessitam de um agente biológico. Mas a grande questão é: com que grau de certeza podemos dizer que algo é realmente uma bioassinatura? Ou seja, algo poderia ser considerado uma bioassinatura mesmo que exista uma probabilidade de não ter sido produzido por vida? Pela dificuldade de garantir a comprovação de que foi realmente a vida que originou essa substância/fenômeno, os cientistas usam o termo bioassinatura para se referir a um indicativo da atividade biológica. qualquer bioassinatura de um exoplaneta será sempre uma bioassinatura com potencial de ter origem biológica (ou não!).
Classificação das Bioassinaturas
As bioassinaturas são divididas em três grupos (ver Fig. 1):
- Bioassinaturas gasosas: são produtos diretos ou indiretos do metabolismo dos seres vivos
- Bioassinaturas de superfície: são assinaturas espectrais resultantes da radiação refletida por organismos. Um exemplo é a clorofila nas plantas da Terra que refletem mais luz no infravermelho do que no vísivel, o que pode causar um “bump” no espectro do planeta. Isso estaria assumindo que as plantas nesses outros mundos realizariam a fotossíntese da mesma forma que as plantas na Terra, quando elas poderiam estar usando outra molécula que não a cloforila e outro comprimento de onda.
- Bioassinaturas temporais: são modulações observáveis que estejam relacionadas com uma resposta da biosfera à mudanças sasonais ou diurnas. Um exemplo de mudança sasonal é a variação de CO2 devido ao crescimento ou diminuição da vegetação.

Bioassinaturas Gasosas
No astropontos de hoje nós vamos nos concentrar nas bioassinaturas gasosas. Iremos falar sobre alguns dos principais gases com potenciais para serem bioassinaturas, pois eles são os principais gases produzidos pela vida terrestre (já que usamos a Terra como modelo para a procura de vida). Vamos começar pelo oxigênio, uma das maiores referências como bioassinatura.
- Oxigênio
No caso da Terra, o acúmulo de oxigênio se deu devido a fotossíntese das cianobactérias há 2.3 bilhões de anos atrás, e em seguida pela fotossíntese das plantas. Mas foi apenas com o aumento da diversidade e complexidade da vida animal que o oxigênio atingiu nível similar ao atual. Porém, é possível que o oxigênio também apareça em grandes concentrações na atmosfera de outros planetas devido à processos não-biológicos (já debatido em astropontos anteriores). Por exemplo, a fotolíse da água pode liberar o hidrôgenio para o espaço (por ser muito leve), deixando altas concentrações de oxigênio que não tem nada a ver com a presença de vida. No caso da Terra, isso não aconteceu porque a alta concentração de nitrogênio em nossa atmosfera fez com que o vapor de água na atmosfera se condensasse em líquido, sendo devolvido à superfície.
O oxigênio possui assinaturas que podem ser potenciavelmente detecadas, mas precisa de uma resolução maior do que aquela necessária para detectar a água. Entretanto, seu sinal estreito e profundo no espectro ainda é mais fácil de detectar do que o sinal do ozônio.
- Metano
Um outro favorito a bioassinatura é o metano. Aqui na Terra boa parte do metano é produzido biologicamente (lembrem-se das flatulências das vacas!). Além disso, existem microorganismos que possuem um metabolismo anaeróbico que libera metano ao respirar CO2. Entretanto, assim como o oxigênio, o metano pode ter origem não-biótica. Existem vulcões próximos aos oceanos que liberam metano produzido em reações de rochas com água marinha. Uma boa forma de comprovar que o metano é de origem biótica é encontrando moléculas de metano e oxigênio juntas. O motivo para isso é que o metano não dura muito se a atmosfera contém moléculas de oxigênio pois o oxigênio faz parte de uma série de reações que consome o metano. Então a melhor forma de manter o metano na atmosfera, se esta possui muito oxigênio, é a partir da vida.
- Ozônio
E claro, não poderia faltar o ozônio. Um gás indispensável para a vida aqui na Terra, pois impede a penetração da radiação ultravioleta (UVC e boa parte da UVB) no nosso planeta. O ozônio terrestre é fruto de reações químicas com as moléculas de oxigênio (fusão desta com um átomo de oxigênio), portanto sua origem vem de uma molécula originada pela presença de vida. Entretanto, o ozônio pode ser produzido por mecanismos abióticos e esse tipo de produção é favorecida principalmente em planetas orbitando estrelas do tipo espectral F e M. Uma outra vantagem do ozônio é que ele absorve a luz em comprimentos de ondas complementares ao oxigênio, no caso, o ultravioleta e o infravermelho médio.
- Óxido nitroso
Por fim, um outro gás com alto potencial para ser bioassinatura é o óxido nitroso (N2O) porque sua principal fonte de produção na Terra atual é a partir da vida. Esse gás é produzido pela biosfera terrestre a partir da desnitrificação do nitrato (NO3-). Em torno de estrelas magnéticamente ativas, o óxido nitroso pode ser produzido abioticamente devido a um aumento da produção de NO e NH a partir do ultravioleta extremo (EUV-XUV) e de partículas energéticas. Entretanto, o mesmo processo abiótico que produz óxido nitroso também gera em uma abundância ainda maior o NOx (nitrogênio óxido), que pode ser observado espectroscopicamente também e dessa forma mostra evidência do processo abiótico. Esse gás possui assinaturas espectrais na faixa do infravermelho, mas algumas das bandas podem ser sobrepostas se tiver a presença de outros gases abundantes como o H2O, CO2 ou o CH4, o que pode tornar a detecção do N2O difícil.
Como detectar as bioassinaturas?
A detecção de uma bioassinatura depende de vários fatores do instrumento, como sua arquitetura (por exemplo, sua abertura e resolução) e a cobertura espectral disponibilizada – como vimos, cada molécula absorve em um comprimento de onda específico. Como também depende do planeta alvo: sua distância, parâmetros planetários (tamanho, albedo e composição) e do tipo espectral e magnitude (brilho) da estrela mãe.
Portanto, a detecção de bioassinaturas vai depender da identificação de planetas candidatos que satisfaçam esses requisitos. Várias missões espaciais prometem encontrar bons candidatos, como a TESS (lançada este ano) e a missão PLATO (a ser lançada em 2026).
Um dos métodos atuais para identificar moléculas na atmosfera de exoplanetas é a espectroscopia de transmissão (já abordada anteriormente aqui no blog), que obtém o espectro da luz que passou pela atmosfera de um exoplaneta. Na busca por bioassinaturas esse método continuará sendo usado por futuros telescópios, enquanto outros instrumentos utilizarão a técnica de imageamento direto. Portanto, o nível de detecbilidade variará com cada um dos métodos.
O futuro telescópio espacial James Webb Telescope, sucessor do Hubble, é um dos instrumentos mais esperados para caracterizar a atmosfera dos planetas candidatos (e possivelmente detectar bioassinaturas!) pelo método de espectroscopia de transmissão. Esse telescópio vai ter uma grande cobertura da faixa do infravermelho o que permite a dectecção de moléculas como a água, metano, monóxido de carbono e oxigênio. O gigante telescópio terrestre ELT (Extremely Large Telescope, primeira luz em meados de 2020) e a missão de imageamento direto LUVOIR (~2030) terão capacidade de fazer as duas funções: identificar planetas alvos e caracteriźá-los em busca de bioassinaturas. A missão WFIRST, planejada para ser lançada em 2025, tem o potencial para caracterizar planetas do tamanho da Terra que estejam na zona habitável das estrelas mais próximas de nós, Alpha Centauri A e B, como também em torno de várias outras estrelas próximas.
Com certeza, todas essas missões irão revolucionar a área de exoplanetas, trazendo vários candidatos potencialmente habitáveis e nos permitindo extrair muito mais informações sobre esses planetas. Só nos restar esperar agora pela primeira luz desses telescópios, enquanto isso muita ciência vai sendo feita para se preparar para a análise dos dados dessas missões.
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