
Título: LGBT+ physicists: Harassment, persistence, and uneven support
Autores: Ramón S. Barthelemy, Madison Swirtz, Savannah Garmon, Elizabeth H. Simmons, Kyle Reeves, Michael L. Falk, Wouter Deconinck, Elena A. Long, and Timothy J. Atherton
Instituição do primeiro autor: Department of Physics and Astronomy, The University of Utah, Salt Lake City, Utah, USA
Status: Publicado em Physics Review Physics Education Research
Alerta de gatilho: o texto cita situações de assédioe outras experiencias potencialmente desconfortáveis.
Todas as pessoas, independente de suas identidades, devem se sentir bem-vindas e acolhidas na carreira que escolherem. Com a crescente visibilidade de cientistas e estudantes de física LGBTQIA+, aumenta também a necessidade de assegurar que cada pessoa se sinta apoiada dentro de seu departamento. O artigo de hoje discute a situação num estudo publicado na Physics Education Research feito por professores da Universidade de Utah.
As conclusões dos autores mostra que há barreiras significativas para cientistas LGBTQIA+ engressarem em física, especialmente aqueles que possuem identidades interseccionais e pessoas trans. Embora sejam problemas conhecidos, os resultados apontam a necessidade de mudanças significativas que precisam ser aplicadas para assegurar que a próxima geraçãod e físicos se sintam confortáveis no trabalho.
O que significa “clima do departamento”?
Clima do departamento ou apenas clima se refere ao ambiente ou atmosfera visto pelos membros de um departamento. Isso pode determinar quão seguro, apreciado ou respeitado um indivíduo se sente dentro de seu ambiente de aprendizagem. Isso é especialmente importante quando se consideram respostas de um grupo de pessoas, como é feito no artigo, já que o clima do departamento pode muitas vezes melhorar ou piorar a experiência de uma pessoa dentro dele.

Muitas vezes, apontar problemas de clima é da responsabilidade de um comitê ou grupo que estabelece regras de Diversidade, Equidade e Inclusão (DEI). Tal comitê deve promover experiências diversas para pessoas entrando ou trabalhando no departamento, assegurando que todos tenham recursos e apoio equitativo, além de garantir que todos se sintam confortáveis e completamente inclusos no ambiente.
A charge acima ilustra o conceito de igualdade e interseccionalidade, além de dificuldades adicionais que pessoas de grupos minoritários enfrentam. Ela é também uma boa forma de enfatizar a diferença entre igualdade e equidade. Enquanto que igualdade dá a todos os indivíduos o mesmo acesso de recursos e oportunidades, a equidade se refere a desvantagens específicas e obstáculos que certos grupos ou indivíduos vivenciam no caminho de obter o mesmo objetivo final. Isso significa que num caminho equitativo, a pessoa da direita teria o necessário para superar os obstáculos.
As respostas
Os autores usam uma estrutura não-comparativa, chadama “teoria do ponto de vista feminista” para discutir os resultados. Isso significa que os autores tentam endenter as experiências das pessoas a partir de suas próprias perspectivas, ao invés de comparar suas experiências com pessoas não LGBTQIA+. Esse método permite que se considerem identidades interseccionais que impactam as experiências dos entrevistados ao invés de focar apenas em parte de suas experiências (o que muitas vezes não pode ser separado de aspectos de identidade; esse é o ponto chave de usar do método interseccional para entender as experiências).

Eles implementaram um questionário perguntando sobre experiências de pessoas LGBTQIA+ na física. É importante destacar a demografia do questionário, onde só há 6 respostas de afro-americanos (de 324 respostas, representando 1,9%), que os autores atribuem essa sub-representação a uma comunidade da física maior. A maioria dos entrevistados estão na academia (estudantes de pós-graduação, graduação, professores, etc.) e a maioria (82,4% é branca). Os autores também apontam que não há respostas de homens-trans, então suas experiências não foram mostradas nos resultados.
O primeiro resultado é mostrado na Figura 1. Note que a estatística de 36% dos entrevistados consideram desistir da carreira ano passado. Outro destaque são as experiências e testemunhos de comportamento excludente (CE, tradução livre para português de “exclusionary behavior“). CE é definido como ser evitado, ignorado, ou assediado devido ao gênero, identidade de gênero, orientação sexual ou identidade sexual.
Respostas por gênero
O nível de conforto no campus/comunidade/organização mudou significantemente quando considerado o gênero, como visto na Figura 2. As pessoas que sentem-se menos confortáveis no ambiente da Física se identificam como não-cisgêneros (ou seja, pessoas cuja identidade de gênero divergem da cis-heterornormatividade, a exemplo de pessoas trans, intersex, não-binárias, gênero fluido etc.)

Uma das maiores disparidades baseadas no gênero é a categoria de CE, onde indivíduos não-cisgêneros têm quase 4 vezes mais chances de vivenciar CE e 2 vezes mais suscetíveis a testemunharem CE quando comparados a homens cis. Por sua vez, mulheres são 3 vezes mais suscetíveis a sofrerem algum tipo de comportamento excludente em comparação aos mesmos.
Isso é ainda mais chocante para pessoas transgêneras (Figura 3). Pessoas trans reportam se sentir significativamente menos confortáveis dentro de suas universidades. Também relatam sofrer CE 2,5 vezes mais e testemunhar 1,5 mais vezes que seus colegas cisgêneros.

Respostas por cor
O estudo não encontrou diferenças estatisticamente significantes entre não-brancos e brancos, o que os autores atribuem ao número limitado de respostas de físicos não-brancos. O que mais choca, no entanto, são as respostas livres.
Uma pessoa relatou, “Acho que lutei mais com o elemento racial do que com a sexualidade, porque o negócio é que é isso que eles veem primeiro. Na verdade, não posso fechar minha cor porque sou [sic], evidentemente, sou pard@, meu cabelo parece diferente, então está lá.”
Outra pessoa destacou, “faz pouco mais de um ano, mas meus alunos tendem a não acreditar que sou competente para ensinar matemática quando me veem, porque sou mulher e minoria.”
Identidades interseccionais para físicos não-brancos que também são LGBTQIA+ são muito importantes quando se considera quão bem acolhidos são estes profissionais dentro de seus departamentos. Focar na experiência de ser LGBTQIA+ e ignorar a questão do racismo perderia uma importante para as identidades desses físicos, e as atitudes complexas que vivenciam dentro do departamento.
O que fazer a partir de agora?
Devem haver muitas reações a este artigo como o astropontos de hoje, que mostra problemas muito graves de assédio e comportamento exclusivo.
Para alguns que leem essas estatísticas, especialmente aqueles que não compartilham de alguma dessas identidades ou não têm a mesma experiência, pode ser algo difícil de processar. Entender experiências de outras pessoas é muito importante para informar como fazer mudanças sistêmicas em benefícil de todos no caminho. Dar atenção a esses problemas é fundamental por uma série de razões, algumas delas são entender que tipo de apoio é necessário, por que algumas pessoas decidem mudar de carreira ou transferir para outros programas, além de entender como seguir em frente.
Para quem recebeu o mesmo tratamento em uma instituição ou ambiente de trabalho, questionários como este servem para validar sua experiência e ajudar pessoas a formar uma comunidade que os ajude e siga em frente. Isso serve para não se sentirem isolades e se sentirem melhor compreendides sabendo que outros passam por situações parecidas.
Na opinião da autora do astrobite: “todos os departamentos deveriam ser mais acolhedores e mais abertos possível para qualquer pessoa o quanto antes. Um estudo como esse nos dá um um ponto de partida em entender o problema de porquê tantas mulheres, LGBTQIA+ e etnias minoritárias largam o campo das ciências exatas (às vezes conhecido como leaky pipeline). É de responsabilidade dos departamentos tomar ações drásticas e escolher mudar seus comportamentos para receber estudantes e funcionários dentro da física”.
Imagem de destaque: “Out in Physics” de Symmetry Magazine.
Adaptado do atrobite: “Developing an inclusive culture for LGBTQ+ physicists” escrito por Jessie Thwaites.