Brilha, Brilha, Quasarzinho

Título: Long-term NIR variability in the UKIDSS Ultra Deep Survey: a new probe of AGN activity at high redshift

Autores: Lizzie Elmer, O. Almaini, M. Merrifield, W. G. Hartley, D. T. Maltby, A. Lawrence, I. Botti, P. Hirst

Instituição do primeiro autor: University of Nottingham, Nottingham, Reino Unido

Status: Aceito pelo MNRAS, acesso livre no arXiv

Recitar a rima “Brilha, brilha, estrelinha” é a primeira introdução que a maioria das pessoas terá para o estudo de variabilidade astronômica. Como a luz de uma estrela distante encontra a atmosfera turbulenta da Terra, ela se afasta do observador, causando o famoso brilho. Observar esse ‘brilho’ é um truque que os astrônomos amadores podem usar para diferenciar estrelas e outros objetos. Da mesma forma, observar a variação temporal da luz de fontes astronômicas é uma técnica crucial na pesquisa em astronomia para ajudar a identificar a natureza de uma fonte desconhecida. O artigo de hoje se concentra no uso dessa técnica para identificar núcleos ativos de galáxias (AGN, do inglês active galactic nuclei), um buraco negro supermassivo no centro de uma galáxia que emite enormes quantidades de radiação.

A emissão de AGN depende muito da taxa e volume de material que está sendo acretado, portanto a luz do AGN que observamos pode ser altamente variável. À medida que a variação da luz AGN se propaga através da galáxia hospedeira, ela interage com o material ao seu redor. Isso cria variações semelhantes no disco de acreção nos comprimentos de onda ópticos, e no toro nos comprimentos de onda no infravermelho. As maiores variações de AGN observadas nas escalas de tempo mais longas são encontradas em comprimentos de onda de detecção mais longos, pois a luz leva um tempo significativo para viajar pela galáxia hospedeira. Portanto, os autores de hoje aproveitam esse efeito de escala e tentam usar a emissão de infravermelho próximo (NIR, do inglês near-Infrared) para identificar a atividade AGN.

Removendo estrelas pequenas (e grandes também)

Os autores buscaram a região de 0,8 graus quadrados no céu coberta pelo Ultra Deep Survey (UDS) do UKIRT. Essa região foi medida pelo UKIRT por 8 anos e possui dados armazenados em arquivos de imagem. Ao usar dados do UDS, os autores pretendem maximizar a detecção de variabilidade de AGN e minimizar a contaminação de outras fontes variáveis, como as supernovas. Não apenas a emissão de supernova tem um decaimento muito característico, ao contrário da AGN, como também é conhecido que o fenômeno completo leva pouco menos de um ano. Este efeito será minimizado pelos intervalos quase anuais das observações UDS.

A próxima maior fonte de erro é a diferença na função de dispersão (PSF, do inglês point spread function) – como o telescópio responde à luz – entre as imagens. Provavelmente isso se deve a mudanças nas condições atmosféricas nos períodos de observação. Para remover isso, eles recriaram a pior PSF e a aplicaram a todas as imagens. Ao aplicar essas correções e remover objetos problemáticos, como estrelas galácticas conhecidas e objetos afetados por artefatos de imagem, os autores acreditam que as fontes de variabilidade não-AGN mais significativas foram minimizadas.

É um AGN, o que você é?

A variabilidade de AGN em comprimentos de onda mais longos, como o NIR, é aperiódica, de grande magnitude e ocorre em escalas de tempo estendidas. Assim, os autores tentam isolar objetos com os fluxos mais continuamente variáveis. Para fazer isso, eles calculam um valor qui-quadrado para cada fonte. Cada detecção de fluxo anual é subtraída do fluxo médio da fonte, elevada ao quadrado e dividida pela incerteza dessa medida. Todos esses desvios são somados, o que resulta no valor do qui-quadrado da fonte. Os autores argumentam que qualquer fonte com um qui-quadrado superior a 30 mostrou variabilidade suficiente para potencialmente ser um AGN. Curvas de luz que ultrapassam ou não esse limite são destacadas na figura 1. 393 objetos excederam o limite de variabilidade. Todos tinham cores e morfologias consistentes com a origem de uma galáxia e não de uma estrela, de modo que os autores concluem que esses objetos são AGN.

Figura 1: Uma comparação de duas curvas de luz em todo o período de observação, ou seja, quão brilhante o objeto é em cada imagem (com o tempo passando da esquerda para a direita). A curva de luz azul à esquerda foi rejeitada porque seu valor do qui-quadrado era muito baixo, dadas as grandes barras de erro e o período relativamente pequeno de variabilidade. A curva de luz vermelha à direita foi considerada variável o suficiente para ser considerada um AGN, pois os pontos são bem medidos e traçam uma curva muito variável. Adaptado das figuras 4 e 5 no artigo.

Os AGN são mais comumente identificados na parte do espectro de raios-X; portanto, os autores usaram uma amostra de 593 AGNs selecionados por raios-X encontrados na mesma área do céu para comparação. Ao realizar essa comparação, eles dividiram a amostra em três categorias para analisar: AGN selecionados somente via raios-X, selecionados via raios-X e variabilidade e selecionados somente via variabilidade.

Figura 2: Massa estelar da galáxia hospedeira em função do redshift da galáxia (pontos cinzas) com os três tipos de AGN destacados: selecionados somente via raios-X (preto), selecionados via raios-X e variabilidade (vermelho) e selecionados somente via variabilidade (azul). Figura 7 do artigo.

As técnicas de seleção via raios-X geralmente são baseadas em um corte simples de luminosidade de As técnicas de seleção via raios-X geralmente são baseadas em um corte simples de luminosidade de raios-X. Portanto, a amostra selecionada apenas por raios-X tende a identificar os AGN mais brilhantes. Ser brilhante também é muito mais fácil quando o buraco negro central que alimenta o AGN possui um grande suprimento de gás, é mais massivo que a maioria, ou ambos. Portanto, é reconfortante ver uma sobreposição de 42% entre as amostras de AGN selecionadas por raios-X e variabilidade. Essa nova técnica não apenas identifica os AGN conhecidos, mas a figura 2 mostra que os AGN selecionados por raios-X e variabilidade são encontrados em galáxias de massa predominantemente alta em todos os redshifts, e a figura 3 mostra que eles têm uma luminosidade de raios X geralmente maior.

Figura 3: Luminosidade dos raios-X contra a luminosidade óptica dos três tipos de AGN: selecionados somente via raios-X (preto), selecionados via raios-X e variabilidade (vermelho) e selecionados somente via variabilidade (azul). Adaptado da figura 8 do artigo.

Com a certeza que a comparação com raios-X nos dá, os autores passam a interrogar a população mais interessante, os AGN selecionados apenas pela variabilidade. Esses AGN são encontrados em toda a distribuição de massa, mas, em particular, a figura 2 destaca que eles são a única população encontrada nas galáxias de menor massa em todos os redshifts. Além disso, a figura 3 mostra uma forte divisão na luminosidade dos AGN em raios-X. AGN selecionados somente via variabilidade são encontrados em galáxias hospedeiras com emissão de raios-X muito mais baixa do que as correspondentes selecionadas via raios-X. Assim, os autores concluem que essa técnica de seleção de variabilidade NIR pode ser usada para detectar AGN normalmente perdidos por outras técnicas de seleção, incluindo aquelas com baixa luminosidade ou galáxias cujo buraco negro central é obscurecido por gás e poeira.

Todas as técnicas de seleção convencionais têm seus próprios vieses inerentes, o que limita nossa capacidade de capturar toda a extensão da população AGN. O trabalho de hoje é importante, pois destacou como aproveitar o brilho de AGN para identificar populações sub-representadas. Uma compreensão mais precisa de onde os AGN residem é crucial para entender melhor o que os desencadeia, como eles afetam as galáxias hospedeiras e a evolução das galáxias em geral.


Adaptado de Twinkle, Twinkle, Little Quasar, escrito por Keir Birchall.

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