Autores: GRAVITY Collaboration
Instituição do primeiro autor: Max Planck Institute for Extraterrestrial Physics (MPE), Garching, Alemanha
Status: Aceito pelo A&A, acesso livre no arXiv
A dança ao redor do monstro
O buraco negro supermassivo (com massas de 106 – 1010 massas solares) mais próximo de nós está localizado no centro de nossa galáxia, a Via Láctea, e é chamado de Sagitário A*, devido à localização do centro galáctico na constelação de Sagitário. A proximidade desse buraco negro nos permite estudar com detalhe os efeitos da altíssima gravidade criada por um objeto tão massivo, o que não é possível fazer com buracos negros em outras galáxias, já que estão mais afastadas. Em post anterior do Astropontos, vimos como foi possível medir o redshift gravitacional, um efeito da gravidade na teoria da relatividade geral (RG), através de observações de uma estrela chamada S2, que tem órbita próxima à Sagitário A*. Hoje vamos saber como foi observado outro efeito da RG sobre S2: a precessão de órbita.
Antes da RG ser proposta por Einstein em 1915, a física que dominava os corpos celestes era descrita por Isaac Newton com suas leis. As leis de Newton descreviam órbitas celestes como sendo fechadas e elípticas, com o ponto de máxima aproximação sendo sempre no mesmo lugar. Porém, segundo a RG, as órbitas podem apresentar precessão, fazendo com que o ponto mais próximo se mova ao redor do corpo mais massivo, desenhando uma rosácea (ver Fig. 1), ao invés de uma elipse. Esse efeito já tinha sido observado na órbita de Mercúrio, antes da teoria de Einstein ser publicada, e é também conhecido como precessão de Schwarzschild.

A diferença está nos detalhes

A diferença entre as órbitas de S2 descritas por Newton e pela RG é, no entanto, muito pequena, mesmo neste caso em que o corpo central é tão massivo. Por isso, para poder detectar com precisão tanto a posição quanto a velocidade de S2, os autores do artigo utilizaram dados dos instrumentos GRAVITY, SINFONI e NACO nos telescópios de 8 metros VLT, no Chile. O grupo de astrônomos já acompanha a estrela S2 há quase três décadas para poder analisar com detalhe os efeitos da gravidade tão próximos de um buraco negro supermassivo. A Fig. 2 mostra como a órbita de S2 é muito parecida com uma elipse fechada. Porém a utilização de dados tão precisos permitem identificar essa diferença.
Para poder realmente identificar a diferença entre Newton e a RG, os autores modelaram a órbita de S2 considerando as duas teorias. Os principais parâmetros da estrela para comparar os modelos são de posição no céu (variações em ascensão reta, declinação e inclinação da órbita no plano do céu, ou ângulo de precessão) e velocidade (diferenças na velocidade ao longo da linha de visão; quão rápido a estrela se aproxima ou se afasta de nós). A Fig. 3 mostra essas diferenças no período de tempo mais recente, próximo do último pericentro em 2018. Podemos ver que a RG reproduz melhor os pontos observados, principalmente para a variação em ascensão reta. Porém, vemos que a diferença é muito pequena (apenas alguns décimos de milissegundos de arco no céu!), e que somente com dados de alta precisão conseguimos diferenciar as duas órbitas.

Mais uma vez, ponto para Einstein. Além desse resultado, as observações de S2 ao entorno de Sagitário A* nos dão mais dicas sobre o que acontece aos arredores do centro galáctico, como a possibilidade de outro buraco negro menor estar orbitando o maior e a distribuição de matéria escura no centro da galáxia. Neste momento, S2 está se afastando do pericentro de sua órbita e de Sagitário A*, e provavelmente os resultados científicos sobre sua órbita já não serão mais tão impactantes no futuro. Porém, com a nova geração de telescópios se aproximando, poderemos observar estrelas mais fracas ao redor do buraco negro central. Quem sabe o que mais podemos encontrar?
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