As estrelas gigantes estão roubando lítio dos seus vizinhos?

Título: Are Lithium-Rich Giants Binaries? A Radial Velocity Variability Analysis of 1,400 Giants.

Autores: M. Castro-Tapia, C. Aguilera-Gómez and J. Chanamé

Instituição do primeiro autor: Pontificia Universidad Católica de Chile, Chile

Status: Publicado no A&A, [acesso aberto]

De alguma forma, estrelas gigantes evoluídas que não estão mais queimando hidrogênio no seu núcleo estão apresentando quantidades inexplicáveis de lítio, em contraste com a expectativa teórica de que elas ficariam pobres em lítio durante o decorrer de suas vida pelo processo de convecção ou mistura. Tentar entender de onde este mistério do lítio vem é uma das questões abertas na astrofísica estelar, motivando os autores do artigo de hoje a investigar os possíveis mecanismos que podem ser responsáveis por enriquecer as estrelas massivas evoluídas em lítio, especificamente a transferência de massa de uma companheira binária. Se a interação binária for um canal importante de enriquecimento, nós esperamos ver estrelas ricas em lítio em sistemas binários com uma taxa maior que suas contrapartidas não enriquecidas.

Para entender a frequência em que estrelas ricas em lítio interagem com uma companheira, os autores do artigo de hoje agruparam uma amostra de estrelas gigantes de baixa massa com abundâncias de lítio bem determinadas e procuraram por evidências de interação binária. Uma maneira de se fazer isso é procurar por variações na velocidade radial de uma estrela, ou da sua velocidade ao longo da linha de visada. Se uma estrela e sua companheira estiverem orbitando ao redor de um centro de  massa comum, é provável que experienciem períodos em que estão viajando em direção ao observador (velocidade radial negativa), para longe do observador (velocidade radial positiva), ou perpendicular ao observador (velocidade radial zero). Portanto, se a velocidade radial de uma estrela estiver mudando com o tempo, é um bom sinal de que está interagindo com uma companheira. Se as estrelas interagentes tendem a ter maiores níveis de lítio que as estrelas solitárias, é possível que a interação possa explicar pelo menos parte do lítio inexplicado que observamos.

Amostra utilizada 

Primeiramente, os autores agruparam toda sua amostra consistindo de estrelas gigantes vermelhas com medidas de velocidade radial e lítio dos catálogos Gaia, RAVE e GALAH, somando 1418 estrelas no total. Então, eles calcularam valores os quais se referem como w_{ij} e w_{t} para cada estrela na amostra para determinar se é possivelmente encontrada em uma binária. Mais especificamente, w_{ij} descreve a variação entre as medidas de velociade radial de dois diferentes catálogos (i.e. Gaia, RAVE e GALAH), e w_{t} é a soma dos valores individuais de w_{ij}, com valores maiores de w_{ij} e w_{t} indicando uma estrela que é mais provável de pertencer a um sistema binário. Dos valores calculados, eles forneceram uma classificação para cada estrela, com Classes 5a e 5b indicando uma estrela que é mais provável estar interagindo com uma companheira binária, e Classes 1-4 indicando estrelas que não apresentam evidências fortes de interação. Eles então olharam qual fração de estrelas ricas em lítio caíram nas Classes 5a e 5b comparado com a população normal de lítio.

Figura 1: A fração de estrelas em cada Classe de variabilidade para as populações normais em lítio (A(Li) \leq 1.5) e ricas em lítio (A(Li) > 1.5), com as Classes 5a e 5b apresentando evidência de variabilidade em velocidade radial. O painel da esquerda inclui todas as estrelas da amostra, enquanto o painel da direita inclui somente as estrelas do ramo de gigantes vermelhas. [Adaptado da Figura 5 no artigo original.]

Resultados encontrados

Os resultados obtidos estão apresentados na Figura 1, que mostra a fração de todas as estrelas (esquerda) e a subamostra de estrelas gigantes vermelhas (direita) que apresentam sinais de interação em ambas as suas populações normais de lítio (A(Li) \leq 1.5) e ricas em lítio (A(Li) > 1.5). Dado que as Classes 5a e 5b apresentam evidência de interação na forma de variação na velocidade radial, uma maior fração de estrelas ricas em lítio classificadas como Classe 5a e 5b poderia indicar que elas são comumente encontradas em binárias. Olhando a Figura 1, é claro que, quando a população inteira é considerada, não existe diferença significativa entre as amostras ricas em lítio e normais em lítio, em relação à fração de estrelas classificadas como 5a e 5b. No entanto, quando consideramos apenas as estrelas do ramo das gigantes vermelhas, a fração de estrelas ricas em lítio de classe 5a e 5b é maior que a fração para estrelas normais em lítio, embora a grande incerteza torne marginal a diferença entre as duas populações.

Dado que a variabilidade da velocidade radial não é mais comum em estrelas ricas em lítio comparado com a população normal em lítio quando é considerada a amostra inteira, os autores sugerem que a interação binária não é o mecanismo principal responsável pelo enriquecimento observado em lítio. No entanto, a análise deles permite a possibilidade de que a interação binária possa ser um fator contribuinte para as estrelas no ramo das gigantes vermelhas. Eles sugerem que essas gigantes vermelhas podem ter uma origem diferente das outras estrelas gigantes ricas em lítio que não apresentam altas taxas de variabilidade, mas maiores medidas de velocidade radial são necessárias para confirmar isso. Infelizmente, por agora, ainda se mantém inconclusivo de onde essas gigantes estelares roubaram seu lítio.


Adaptado de Are Giant Stars Stealing Lithium from Their Neighbours?, escrito por Sonja Panjkov.

Deixe um comentário