Está ficando quente, vamos tirar toda a água daqui

Título: A dry Venusian interior constrained by atmospheric chemistry

Autores: Tereza Constantinou, Oliver Shorttle, and Paul B. Rimmer

Instituição do primeiro autor: Institute of Astronomy, University of Cambridge, Cambridge, Reino Unido

Status: Publicado na Nature Astronomy [acesso aberto]

Vênus é conhecido como o irmão gêmeo do mal da Terra, já que tem o mesmo tamanho e massa. No entanto, enquanto a Terra é coberta por vastos oceanos e ricas florestas, Vênus tem uma superfície inóspita. Sob camadas de nuvens tóxicas de ácido sulfúrico existe um solo com montanhas, vales e milhares de vulcões. Embora de tamanho, composição e distância até o Sol similares aos da Terra, a superfície escaldante de Vênus não é apta para a vida como conhecemos, que requer presença de água líquida. Mas sempre foi assim? Os autores do artigo de hoje investigam a história do nosso vizinho mais próximo, explorando a pergunta: Vênus sempre foi um lugar infernal, ou já teve clima para ter água líquida?

Duas fases de Vênus

Quando se considera a história de Vênus, dois paradigmas surgem: “Vênus úmido” e “Vênus seco”. Em ambos os cenários, Vênus se forma com um oceano de magma na sua superfície. Os autores sugerem que se essa foi uma fase curta, isto é, o oceano de magma esfriou e solidificou rapidamente, Vênus poderia manter um armazenamento de água líquida. Nesse cenário, nuvens se formariam no lado iluminado, reduzindo a radiação absorvida, e se desmanchariam no lado noturno, permitindo que o calor diurno fosse irradiado de volta para o espaço. Isso manteria temperaturas amenas o suficiente para manter água líquida na superfície por bilhões de anos até a “grande transição climática“, uma era em que atividade vulcânica levou à produção de CO2 e SO2, deixados para trás na atmosfera atual de Vênus.

Por outro lado, se o oceano de magma de Vênus se solidificou lentamente, o planeta pode ter secado muito mais rápido em sua evolução. Neste cenário, nuvens contianuariam a existir no lado noturno, aprisionando o ar quente do dia e aquecendo o planeta. Qualquer água líquida inicialmente presente evaporaria. Para tentar entender estes dois modelos, os autores investigam se hoje Vênus possui um interior rico em água.

É o que há no interior que importa

Os autores sugerem que se Vênus tivesse mantido oceanos de água depois dos de magma, então a água ainda estaria presente no seu interior. No cenário de Vênus úmido, a água que existiu na superfície ficaria eventualmente presa em seu interior, que se tornaria rico em hidrogênio. Essas dois caminhos estão ilustrados na Figura 1. Para estudar o que há abaixo da superfície, os autores usaram a composição presente de gases vulcânicos em Vênus para entender a composição do interior.

Erupções vulcânicas liberam gases presos no interior de camadas profundas do planeta, permitindo-nos mapear em quais regiões esperamos achar H2O no cenário úmido. Os autores calcularam a abundância relativa de moléculas dos gases vulcânicos e compararam com os da Terra, que possui cerca de 96% de H2O. Eles encontraram que o conteúdo de água máximo nos gases vulcânicos de Vênus é de 6%, sugerindo que seu interior é bem seco. Esse resultado é consistente com o cenário com o qual o oceano de magma de Vênus se solidificou lentamente, nunca permitindo manter água. Dito isto, Vênus sempre foi um planeta inabitável.

Embora venusianos possam ser personagens de ficção científica, esse resultado é interessante porque nos diz quais planetas são mais prováveis de ter água líquida e potencialmente vida. Quando procurarmos planetas habitáveis com o JWST ou futuras missões, podemos eliminar os planetas na zona de Vênus e focar nos mais prováveis a sustentar vida.

Figura 1: Cenários climáticos para Vênus. Depois da formação, Vênus é encoberto por um oceano de magma (t= 0 Myr). No cenário superior, o magma se solidifica lentamente e o planeta fica sem poder reter água na fase líquida. No cenário inferior, o magma se solidifica rapidamente e água líquida persiste por bilhões de anos (figura 1 do artigo).

Adaptado de It’s Getting Hot in Here, So Take Off All Your H2O, escrito por Tori Bonidie.

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