Separando o joio do trigo: Estimativa de parâmetro cosmológico com linnha de 21 cm

Título: 21 cm Intensity Mapping cross-correlation with galaxy surveys: current and forecasted cosmological parameters estimation for the SKAO

Autores: Maria Berti, Marta Spinelli, Matteo Viel

Instituição do primeiro autor: Trieste, Italy; International School for Advanced Studies, National Institute for Nuclear Physics, Institute for Fundamental Physics of the Universe

Status: Submetido ao MNRAS [acesso fechado]

O model ΛCDM de cosmologia é o modelo padrão para entender a estrutura, composição e história do universo desde os primeiros instantes. Ele descreve todo o espaço-tempo em seis parâmetros principais, e quanto mais preciso nosso conhecimento sobre os parâmetros, melhor nosso entendimento sobre questões fundamentais da cosmologia como a tensão de Hubble. Os autores do artigo de hoje descrevem e testam um novo método para estimar esses parâmetros usando um mapa tridimensional do estrutura de grande escala do universo.

As sementes da estrutura de grande escala

Tradicionalmente, os parâmetros do ΛCDM são estimados usando radiação cósmica de fundo, da sigla CMB (Cosmic Microwave Background). Durante a a primeira fração de segundo da história cósmica, a inflação permitiu o crescimento de pequenas flutuações de densidade e temperatura. Despois de 380.000 anos, essas flutuações cresceram e encolheram devido a interação com a pressão de radiação e atração da gravidade em uma escala específica que dá o formato do espectro de potência da CMB, um fenômeno chamado de Oscilações Acústicas de Bárions.

No entanto, essas pequenas flutuações deram origem à estrutura de grande escala do universo, então os parâmetros cosmológicos devem governar não só as condições iniciais mostradas na CMB mas também a distribução de matéria atual. Essa é a base para a técnica usada pelos autores de hoje, chamada de mapeamento de linha de intensidade (LIM). Similar à Lyman-α forest, LIM se baseia no fato de que gás emite luz a comprimentos de onda específicos que depois são esticadas (redshift aumenta) pela expansão do universo. Quanto mais distante é a luz, maior o redshift, produzindo um espectro que é cheio de diferentes versões da mesma linha espectral, emitido por gás a várias distâncias. Então rastreando a intensidade de uma linha para vários redshifts, cosmólogos podem mapear a densidade de gás emitindo tal linha em três dimensões!

No artigo de hoje, os autores estão interessados na linha espectral de 21 cm, criada quando o spin do elétron do átomo de hidrogênio muda de um estado para outro. Essa linha é de interesse para uma variedade de sub-áreas da astronomia, nesse caso ela é útil porque a transição acontece aleatoriamente em átomos de hidrogênio neutros. Hidrogênio neutro é extremente comum no universo, especialmente em redshift alto, que faz da linha de 21-cm uma forma poderosa e eficiente, embora de baixa resolução, de observar grandes volumes do espaço-tempo.

Encontrando agulha no palheiro

A linha espectral de 21-cm tem o potencial de ser uma ferramenta poderosa para a cosmologia. Infelizmente, ela é bem ruidosa; fontes na galáxia, a ionosfera terrestre e até transmissores de TV e rádio emitem radiação nessa faixa de comprimento de onda, então observadores têm que lidar com contaminação por interferência de outras fontes de luminosidade até conseguirem o sinal real do que procuram. A contaminação pode ser reduzida se o observatório for fora da atmosfera, mas como a maioria das observações planejadas de LIM são em terra, os astrônomos devem ser criativos para contornar o problema.

Figura 1: Distribuição de possíveis valores para oito parâmetros cosmológicos considerados pelo artigo de hoje. Da esquerda para a direita no eixo horizontal: densidade de bárions e matérica escura, índice espectral, amplitude do espectro de potência primordial, profundidade ótica na reionização, constante de Hubble e flutuação de densidade atual. Quatro distribuições distintas são mostradas, uma para cada combinação discutida no astroponto. Fonte: Figura 6 no artigo.

Uma forma de mitigar a interferência se dá pela correlação entre as observações de LIM com levantamentos de galáxias em outros comprimentos de onda e com observações de CMB. Para testar essa ideia, os autores começaram usando o modelo ΛCDM com parâmetros estabelecidos a partir dos resultados do satélite Planck para simular observações de LIM num universo com tal cosmologia. Eles adicionam efeitos que poderiam potencialmente distorcer essas observações realisticamente incluindo tanto o ruído quanto a possibilidade de o modelo ΛCDM estar errado. Finalmente, eles correlacionam essas simulações com simulações de levantamentos como o Euclid e o DESI para produzir uma correlação-cruzada do espectro de potência (função que relaciona flutuações de densidade de matéria com a escala), que pode ser usada para estimar parâmetro do ΛCDM.

Com as simulações, os autores podem analisar como se fossem observações reais; nesse caso eles usam o algoritmo de Markov Chain Monte Carlo para criar a distribuição de todos os possíveis valores para os parâmetros cosmológicos que poderiam gerar tais dados. Isso é feito com uma variedade de combinações de LIM e levantamentos galáticos além do espectro de potência de CMB do Planck, comparando os ajustes ao ΛCDM obtidos através de dados de CMB com a combinação entre LIM e CMB, depois CMB de 2 levantamentos galáticos e por fim os quatro simultaneamente.

Os autores conseguiram mostrar que a combinação dos quatro tipos de dados é interessante para produzir ajustes mais precisos do ΛCDM. O efeito é proeminiente para densidade de matéria escura e a constante de Hubble, que são correlacionadas entre si. O fato de que uma análise com linha de 21-cm pode ajudar a quebrar a degenerescência é promissora, e significa que num futuro próximo, poderemos calcular um modelo ΛCDM perto da realidade. Podemos até não ter todas as respostas, mas estamos no caminho.

Adaptado do astrobite Separating the cosmic wheat from the chaff: Cosmological parameter estimation with the 21-cm line, escrito por Abigail Lee.

Figura de destaque: Wikimedia Commons.

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