Hora da soneca: o feedback de AGN faz com que nosso universo tire uma soneca ‘cósmica’ à tarde?

Título: Distinguishing AGN Feedback Models with the Thermal Sunyaev-Zel’dovich Effect

Autores: Skylar Grayson, Evan Scannapieco, Romeel Davé

Instituição do primeiro autor: School of Earth and Space Exploration, Arizona State University, EUA

Status: Submetido ao Astrophysical Journal [acesso aberto]

Imaginemos a evolução do universo como um dia regular na Terra. Se o Big Bang ocorreu quando o relógio marcava meia-noite, então o ‘amanhecer cósmico‘ é quando as primeiras estrelas e galáxias começam a iluminar nosso universo. Depois do término do amanhecer cósmico, as galáxias continuam formando estrelas e crescem rapidamente ao longo da manhã. Por volta do ‘meio-dia cósmico‘, a maioria das galáxias em nosso universo eram enormes e até mesmo hospedavam buracos negros massivos em seus centros. No entanto, conforme o entardecer avança, o universo parece ficar mais letárgico na formação de estrelas e na expansão das galáxias. Parece que o Universo gosta de tirar uma soneca à tarde!

O que faz com que a rápida formação de galáxias no universo repentinamente desacelere e pare a formação estelar? Por que elas não continuam crescendo até tamanhos cada vez maiores? Alguns astrônomos acreditam que essa redução cósmica é devido ao feedback de buracos negros ativos (conhecidos como Núcleo Galáctico Ativo ou AGN, do inglês Active Galactic Nuclei). Esse feedback tipicamente ocorre quando o buraco negro ejeta ventos rápidos (chamados de fluxos de saída) que contêm gás e poeira e os expelem a longas distâncias, algumas vezes muito além da própria galáxia. Fluxos assim podem limpar a galáxia de qualquer gás de formação estelar e efetivamente interromper a formação de estrelas.

Ainda há muito mistério em torno de como exatamente o feedback da AGN afeta a formação estelar em galáxias. No entanto, vários modelos de feedback são frequentemente incorporados em simulações de formação de galáxias para entender como o universo evoluiu. Isso leva a teorias contrastantes de evolução galáctica, portanto, a comparação entre
simulação de modelos de feedback e observações reais de efeitos de feedback é essencial para incrementar nosso entendimento do feedback de AGN.

É difícil observar diretamente um fluxo de AGN, por eles poderem ser tão rápidos quanto milhares de km/s e não conseguirem ser capturados instantaneamente. Em vez disso, podemos procurar por evidências indiretas. Nosso universo é preenchido com radiação cósmica de fundo (RCF), que se acredita ser um remanescente do universo primordial. Se
temos alguns fótons altamente energéticos de gás aquecido por uma poderosa atividade, como um buraco negro ejetando material, eles poderiam possivelmente interagir com fótons de baixa energia da RCF e dar a ela um ligeiro impulso. Esse efeito, conhecido como
Sunyaev-Zeldovich Térmico (SZt), é uma boa pista de um episódio de feedback de AGN.

Os autores do artigo de hoje se dispuseram a fazer isso. Eles comparam observações de galáxias com sinais do efeito SZt e sinais produzidos por simulações de galáxias com e sem feedback de AGN. Isso pode ajudá-los a determinar se as simulações modelam corretamente o feedback de AGN e se esse feedback explica acuradamente a redução cósmica observada.

Comparando Simulações vs. Observações

Os autores geraram mapas do sinal SZt do SIMBA, que é uma simulação que explora a coevolução de galáxias e buracos negros. Eles geram um conjunto de mapas com galáxias que têm feedback de AGN e outro conjunto sem esse feedback. Eles destacam uma sub-amostra de galáxias das primeiras como quiescentes ou galáxias que têm desaceleração e não têm formação estelar contínua. Há muitas galáxias desse tipo no universo, e elas provavelmente estão lá porque o feedback da AGN removeu completamente todo gás na galáxia e assim interrompeu permanentemente a formação de estrelas.

O efeito SZt de observações pode ser detectado inspecionando distorções nos dados da RCF coletados por radiotelescópios (os fótons na RCF possuem baixa energia e, por isso, precisam de telescópios com longos comprimentos de onda para serem estudados). Os autores usam dados de rádio de uma amostra similar de galáxias com AGN (incluindo galáxias quiescentes) e sem AGN. Eles fazem isso em dois redshifts, z = 1 e z = 0.5. Os autores combinaram os dados simulados com efeitos observacionais adequados para que pudessem ser comparados
realisticamente.

O parâmetro Compton y é, então, usado para comparar o sinal observado com o sinal simulado. O parâmetro Compton y é definido como o número de espalhamento vezes a energia ganha por instante de dispersão, e é um termo comumente usado para caracterizar o espalhamento em um sistema. Como visto na Figura 1, em z = 1, os dados observacionais
concordam bem com o modelo AGN-quiescente e com o modelo de AGN em geral, e não se alinha bem com o modelo sem AGN, indicando que o feedback de AGN incorporado pela simulação é bem sucedido ao replicar propriedades observacionais nesses redshifts.

Figura 1: Comparação entre sinais SZt observado e simulado no redshift igual 1. Os dados observados (pontos pretos) concordam com o modelo de feedback de AGN. Crédito da imagem: Figura 5 do artigo de hoje.

Em z = 0.5, os autores comparam as flutuações de temperatura, que também dependem do parâmetro Compton y. Fazendo isso, as propriedades observadas replicam o modelo sem AGN em vez do modelo com AGN (Figura 2). No entanto, isso também pode indicar que as simulações precisam modelar corretamente o feedback de AGN. As simulações provavelmente injetam muita energia em seus modelos de feedback de AGN em altos
redshifts, o que pode prejudicar nosso entendimento das propriedades da galáxia que elas reproduzem.

Figura 2: Comparação entre sinais SZt observado e simulado em redshift igual a 0.5. Os dados observados (pontos pretos) não concordam com o modelo de feedback de AGN, mas isso ocorre provavelmente porque o feedback de AGN é modelado incorretamente nas simulações. Crédito da imagem: Figura 6 do artigo de hoje.

Esse trabalho destaca a importância de buscar por assinaturas para comparar as observações e simulações para melhorar nosso entendimento de como galáxias evoluem, especificamente após o meio-dia cósmico. Os benefícios disso são dois: um deles será verificar se as observações concordam com a nossa compreensão de como elas devem evoluir, incorporada pela física nos modelos de feedback. Por outro lado, também nos ajuda a entender se as simulações estão modelando a física corretamente e se alguma modificação é necessária em nosso conhecimento dos processos de feedback.


Traduzido para o português do astrobite original “It’s Nap Time: does AGN feedback cause our universe to take a “cosmic” afternoon nap?“, escrito por Archana Aravindan e editado por Jack Lubin.

Créditos da imagem em destaque: ESA/Hubble & NASA.

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