Quando as estrelas se alinham

Título: First semi-empirical test of the white dwarf mass-radius relationship using a single white dwarf via astrometric microlensing

Autores: Peter McGill, Jay Anderson, Stefano Casertano, Kailash C. Sahu, Pierre Bergeron, Simon Blouin, Patrick Dufour, Leigh C. Smith, N. Wyn Evans, Vasily Belokurov, Richard L. Smart, Andrea Bellini, Annalisa Calamida, Martin Dominik, Noé Kains, Jonas Klüter, Martin Bo Nielsen, Joachim Wambsganss

Instituição do primeiro autor: Institute of Astronomy, University of Cambridge (Reino Unido) & Department of Astronomy and Astrophysics, University of California Santa Cruz (EUA)

Status: publicado no MNRAS [acesso aberto]

Nosso Sol, como a maioria das estrelas, vai eventualmente virar uma anã branca, um remanescente estelar muito denso em que a gravidade é equilibrada pela pressão de degenerescência dos elétrons. Dois elétrons não podem ocupar o mesmo estado de spin e energia na mesma região, conforme descrito pelo princípio de exclusão de Pauli. Isso significa que, para materiais muito densos, os elétrons são empurrados para níveis de energia cada vez mais altos, movendo-se em altas velocidades e criando pressão do centro para fora. Desde que o objeto permaneça abaixo de aproximadamente 1,4 vezes a massa do Sol (o limite de Chandrasekhar), essa pressão pode suportar uma estrela contra sua própria gravidade e evitar seu colapso.

Uma consequência desse equilíbrio entre forças é que, quanto mais massiva é uma anã branca, menor ela é. Considerando apenas o equilíbrio entre a pressão de degenerescência dos elétrons e a gravidade, pode-se mostrar que o raio de uma anã branca deve ser inversamente proporcional à raiz cúbica de sua massa (R ~ M-⅓). Mas objetos reais não são tão simples assim. Essa relação massa-raio varia com base em outras propriedades da estrela, como sua composição e temperatura. Para calibrar a relação massa-raio, trabalhos anteriores estudaram principalmente anãs brancas em sistemas binários eclipsantes, onde a massa e o raio podem ser medidos com precisão. O artigo de hoje utiliza pela primeira vez um outro método para testar a relação massa-raio: microlentes astrométricas.

O poder de uma microlente

Os eventos de microlentes acontecem quando um objeto massivo (a lente) passa na frente de outro objeto luminoso (a fonte), ampliando e distorcendo temporariamente a imagem que vemos da fonte. Além de a fonte parecer mais brilhante, sua posição também parece mudar ligeiramente no céu. Esse efeito é chamado de “microlente astrométrica” e é ilustrado na Figura 1.

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Figura 1: Animação representando um evento de microlente astrométrica no referencial da estrela fonte. Vemos a estrela lente amarela passar muito perto da fonte, cuja verdadeira posição é mostrada com um círculo vazio vermelho. O efeito de lente nos faz ver duas imagens distorcidas da estrela mostradas em azul, que se movem ao redor do anel de Einstein da estrela lente, marcado por um círculo verde. Na microlente astrométrica, não podemos realmente resolver as imagens azuis separadamente e, em vez disso, vemos uma posição aparente indicada pelo círculo vermelho preenchido. No painel inferior da animação, vemos como a posição dessa imagem aparente muda com o tempo, criando um sinal astrométrico. (Crédito da animação:Scott Gaudi)

Embora a abordagem mais comum para detectar eventos de microlente seja monitorar um grande número de estrelas e esperar por um encontro aleatório, às vezes os eventos de microlente podem ser previstos. O evento estudado no artigo de hoje foi previsto em 2018, com base nas trajetórias das estrelas fonte e lente medidas pelo satélite Gaia.

O evento LAWD 37

LAWD 37 é a segunda anã branca mais próxima do Sol e é a lente neste evento de microlente. Durante um ano, uma série de observações com o Telescópio Espacial Hubble (HST) foram feitas na região prevista para o evento. Imagens para 9 épocas de observação são mostradas na Figura 2.

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Figura 2: Imagens do HST durante o evento de microlente. As estrelas, vistas pelo HST, são mostradas em preto. A linha verde traça o caminho da estrela lente ao longo do tempo (que aparece ondulado devido à órbita da Terra), e os pontos vermelhos marcam sua localização durante as observações. O círculo azul marca a estrela fonte. A estrela lente está saturada, causando transbordamento de carga para os pixels vizinhos. Figura 2 no artigo.

A previsão original do evento de microlente estimou uma mudança astrométrica de cerca de 2,8 milissegundos de arco, que é muito pouco para ser visto a olho nu na figura, mas grande o suficiente para ser medido com astrometria precisa. Para determinar se as pequenas mudanças medidas eram realmente o resultado de microlentes astrométricas, os autores compararam ajustes usando quatro modelos diferentes, com e sem um sinal de microlente astrométrica, e com e sem ruído correlacionado.

A relação massa-raio

O modelo incluindo um sinal de microlente astrométrica e ruído correlacionado é o melhor ajuste aos dados, embora o ruído correlacionado sozinho tenha um desempenho melhor do que a microlente sozinha. O monitoramento adicional das duas estrelas para medir com mais precisão o movimento da fonte poderia descartar o modelo de ruído correlacionado por si só, que sugere um movimento próprio da estrela fonte significativamente maior do que o inicialmente medido pelo Gaia.

O modelo de melhor ajuste com microlente astrométrica e ruído correlacionado resulta em uma massa de lente de 0,56 ± 0,08 massas solares. O ajuste do modelo atmosférico para LAWD 37 sugere um raio de 0,0127 ± 0,0003 raios solares que, dada uma relação massa-raio, resulta em uma massa de 0,57 ± 0,01 massas solares. Os resultados suportam os modelos existentes para a evolução das anãs brancas, mostrando concordância tanto com a relação massa-raio teórica quanto com as taxas de esfriamento esperadas.

Este trabalho foi apenas a terceira vez que um evento de microlente astrométrica previsto foi detectado e fornece lições para o futuro de tais observações. Devido ao alto movimento próprio de LAWD 37, os astrônomos já previram mais de seus eventos de lente nas próximas décadas, o que ajudará a refinar as medições da massa da anã branca.


Adaptado de: A Predicted Alignment of the Stars, escrito por Macy Huston.

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